CONTRA - Onde é que eu já ouvi isto?

George Santayana disse que «quem não conhece bem a História estará sempre condenado a repeti-la», e Jorge Mendes disse que «quem conhece bem a História estará sempre condenado a vê-la repetida».

Vêm estas sábias palavras a propósito de «Contra» dos Vampire Weekend, que cavalga imponente o seu hype. Já tinha prometido passar uma hora a ouvir o álbum, e cumpri.

Que estória é essa da história repetida? Conta-se em poucas palavras. Para a malta mais jovem, este exótico som dos Vampire Weekend soa a novidade. É normal, não estavam cá(pelo menos para a música) em 1985.

Eu comecei a ouvir a coisa do «Contra» e comecei-me a sentir em casa, demasiado em casa para o meu gosto. É que eu sou um rapaz baixo, e apoio os artistas da minha estatura, por isso conheço muito bem, e já escrevi aqui sobre Paul Simon.

Este álbum tem quatro músicas(apenas para me cingir às óbvias) destiladinhas do alambique de Simon, colheita 1985(Graceland) e 1990(The Rhythm of the Saints), com uma pitada de Surprise(2006). 'White Sky' vestiu o sintetizador e a métrica de «Proof» de Rhythm of the Saints sem grandes disfarces. «California English» vai Gracelandizando por aí, e 'Diplomat's son' é uma mistura entre 'Diamonds in the soles of the shoes' e 'Proof' mais uma vez (gostaram mesmo desta). 'I Think UR a Contra' soa ainda a Paul Simon, mas mais na versão com Brian Eno (Surprise).

Os Vampire Weekend têm o mérito de ter o bom gosto de gostarem de Paul Simon, mas não vejo valor acrescentado nenhum em copiar o estilo com músicos piores e canções destituídas do génio da composição de Simon(se este post vos apelar à curiosidade de ouvir os dois álbuns que referi, perceberão do que falo). Como me pareceu tão óbvia a Paul-Simonização dos Vampire Weekend, googlei pelos dois nomes...e surpresa! Não falta malta a acusar os VW pilharem Graceland(ex: aqui, aqui e aqui), mas referindo-se ao álbum anterior, não a este. Deixaram-me curioso.

E o resto do álbum? 'Horchata' é uma simples e leve canção pop, de consumo imediato; 'Taxi Cab' é uma cantilena infantil monótona, 'Run' é para mim a segunda melhor música do álbum, sendo um pouco mais rica em termos de composição e arranjos, mas sem sair do Pop Casiotone. 'Cousins' solta guitarras à desfilada tocadas como bandolins e ouve-se muito bem, mas não explica qual é a pressa e consome-se depressa. 'Giving Up' continua melódica e limpinha(e o bocejo é inevitável). 'I think UR a Contra' é uma boa canção, e gosto dos arranjos, ambiência e respiração.

De simplicidade, arranjos minimalistas e teclados à Casio são feitas muitas boas músicas, por isso não é pelo simplismo que vou desmerecer este álbum. Este 'Contra' merece pelo menos os seus 15 minutos de voragem juvenil, mas ao que vem esta banda?

Os Velvets tocavam com três acordes e assassinavam o flower-power; Os Sex Pistols e os Clash corporizavam a revolta contra o desemprego e a ausência de futuro no horizonte dos finais dos anos 70; a Joy Division existencializava os tormentos de Ian Curtis sublimando-os em poesia, boa poesia. Os Smiths partiam de Oscar Wilde e forneciam profundidade poética, ironia e veneno anti-Tatcher e anti-Monarquia ao cinzentismo dos 80 ingleses. Os Radiohead são escultores que vão procurando sempre novas maneiras de moldar numa imagem musical as angústias desta nossa realidade acelerada, anónima, massificada, desfuncional e em suma, sufocante.

O que têm os Vampire Weekend para merecerem uma linha na história da Pop, alguém sabe?



Comentários

  1. Os Vampire Weekend acrescentam muito. Num mundo que por vezes parece querer fazer ressurgir a luta de classes, eles são os diplomados que fazem música para todos. Subvertendo os princípios do punk, não hesitam em usar os pólos e as camisas xadrez dos meninos bem, ai mesmo tempo que fazem ritmos exóticos soar a cosmopolita.

    A música dos Vampire Weekend pode ter parecenças com a do Paul Simon, mas sinceramente não me parece nada decalcada.

    Da mesma forma, a música dos The Horrors pode reunir e mesmo reciclar influências vindas dos Bauhaus, The Cure e Joy Division, mas não considero que sejam menos geniais por causa disso.

    Estamos condenados à lei de Lavoisier. E no saber transformar é que está a chave do sucesso.

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  2. "O que têm os Vampire Weekend para merecerem uma linha na história da Pop, alguém sabe?"

    Olha, eu não sei que não ouvi nem vou ouvir. Para mal dos meus pecados, que ainda estava esperançado que aquilo tivesse ponta por onde se lhe pegasse,e como confio na tua audição, agora é que não lhe pego mesmo. Enfim, tinhas de te armar em Luiz Pacheco naquela história do Fernando Namora ! Que tentavam vampirizar os Talking Heads acho que toda a gente já tinha notado. Mas até o Paul Simon ?!?!

    Pelo que me apercebo, os Vampire Weekend estão para os anos 00/10 da mesma forma que os Hothouse Flowers, por exemplo, estiveram para os 80/90, não sei se estás a ver...

    Toda esta história fez-me lembrar o outro teu post sobre tirar as calças no metro, só que estes, segundo diz o Miguel Vaz, vestem polos e camisas à meninos bem. Vai dar tudo ao mesmo, acredita.

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  3. Devo dizer em primeiro lugar que a ideia de pilhagem de Paul Simon não é minha mas dos links que apontei. Num deles os próprios VW tentam defender-se dessa ideia de serem, não parecidos, mas demasiado parecidos com Paul Simon. Como indico no post, eu encontrando as semelhanças, procurei no Google a ver se seria só impressão minha. Não era.

    Eu compreendo o argumento do Miguel de que os rapazes de bem e de camisas aos quadrados fazem música para o povo e vão à universidade. Penso que a história da Pop está recheada de casos desses, incluindo os casos mais insuspeitos como o de Joe Strummer dos Clash que era 'Diplomat's Son'. A diferença creio eu está na ostentação do facto.

    Talvez eu esteja a perder o barco da juventude nos meus trinta e poucos anos, mas para além dessa suposta atitude «não temos medo de mostrar que somos da fina flor», que não é má nem boa em si, não encontro uma ideia que os Vampire Weekend me queiram transmitir.

    Paul Simon sempre foi um estudioso da música do mundo. Ainda em 1970 ele faz uma versão de 'El condor pasa', uma canção tradicional dos Andes. Em 85 ele procura em Graceland as raízes do Rock'n'Roll americano na música negra, e seguindo as pistas leva-nos à música africana, cuja exploração faz, com o respeito de ir buscar músicos a toda a África(Nguini dos Camarões, Ray Phiri da África do Sul, o baixista do Senegal, etc...) para nos dar o verdadeiro som de África. Volta a repetir a dose em 1990 com Rhythm of The Saints desta vez com outros ritmos filhos de África, os do Brasil. Mais uma vez recruta Olodum , Milton Nascimento e muitos mais para ser fiel ao espírito e à forma.

    Os Vampire Weekend apanham essas influências africanas já nos filtros de Simon, possivelmente Talking Heads e outros, mas na minha opinião não vão fundo. Fazem música pop, que não tem de ser profunda, mas também não justifica a meu ver neste caso tamanho hype.

    Reciclar é o que fazem todos, mas reciclar é transformar e fazer essa transformação servir o nosso estilo. Os Vampire Weekend têm um estilo próprio, vincado? Na minha opinião a personalidade da banda está um pouco apagada pela personalidade daqueles em quem se inspira. Pegando em exemplos anteriores...em quem se inspiram os Radiohead? Os Massive Attack sampleiam em Mezzanine desde 'The Cure' a 'Velvet Underground', mas é preciso escavar um bocado(ler o booklet) para chegar lá.

    O trabalho dos Vampire Weekend faz-me lembrar o que já li acerca de muitos escritores, que afirmam que os primeiros esboços dos seus trabalhos lhes soam demais às suas influências, mas que depois de laboriosas iterações de reescrita chegam ao seu estilo próprio. Lembro-me de Elvis Costello(e B Fachada já agora) que disse que começava muitas das suas canções suas a partir de canções de outros, deturpando-as até serem suas. Os Vampire Weekend têm que fazer os restantes 90% de transpiração por esta cartilha, porque as suas canções ainda não são suficientemente suas.

    Os VW são uma decente banda pop, mas não exageremos.

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