Cantares do Minho


Interessante discussão no blog Etnografando com Letras acerca dos cantares do Minho. Este post é um comentário que já ia longo.

Eu nasci e vivi no Minho a maior parte da minha vida. Os meus filhos são minhotos.

Serve este intróito para dizer que estive exposto de perto ao folclore, e convivi mais de perto com ele enquanto membro de uma Tuna Académica, na qual tocamos alguns temas tradicionais.

O que posso dizer é que não pude ter outro sentimento, depois de anos a ouvir gritarias nos rádios da igreja por alturas do S.Mateus, do que ódio pelos ranchos folclóricos.

Infelizmente as manifestações que vi de folclore no terreno sempre foram as da cultura «pop» aludida num comentário na discussão mencionada. Concertinas e acordeãos cedo desaguando na «mãe querida», e cantares ao desafio brejeiros.

Já na Tuna, quando procurávamos temas, mesmo sendo minhotos não tínhamos direccionamento para bem escolher e bem aprender a interpreta-los. Aprendi a tocar cavaquinho ouvindo o Júlio Pereira. Há bons executantes, como veremos no vídeo que postarei mais abaixo, mas não havia uma cultura de espectáculos de qualidade baseados na música regional, como lhe chamava Giacometti. Ou se calhar andava a dormir (o que não é nada de por de parte).

Demorou muitos anos até começar a ver o desvanecimento dos preconceitos que fui formando. A pouco e pouco vou descobrindo que existem maravilhas que raramente vemos ou ouvimos nos grandes meios de comunicação. Giacometti foi uma grande descoberta, ou redescoberta, pois nos anos 80 ainda se ouvia algo das suas recolhas na rádio.

A forma como o folclore é popularmente cultivado no Minho afasta os minhotos do folclore. Eu pessoalmente fujo a sete pés de um rancho, mas fico maravilhado com o Júlio Pereira, ou com as polifonias que ouvimos no vídeo do post do «Etnografando com Letras» que ligo acima.

Nesse âmbito é preciso procurar a boa música, e felizmente a internet traz-nos algumas alegrias.

Este homem, Amadeu Magalhẽs, é de Coimbra e vi-o tocar discretamente com o José Cid. Faz parte de um grupo de música tradicional, «O Realejo». Ele está só a brincar, mas nem daqui a dez anos o meu cavaquinho tocará assim nas minhas mãos:

Comentários

  1. Apenas acerca da primeira foto, ainda há pouco tempo, subindo de bicicleta até à Sr.ª da Saúde (que é uma das subidas mais "chatas" da zona a par do Sameiro pelo lado São Cláudio)parei e tive a mesma perspectiva.

    Pensei para mim: Será que o Minho, mesmo aberrantemente destruído pela ignorância (ou será corrupção) dos planeadores camarários e dos entusiasta do betão, consegue ser feio?

    Não.

    Mesmo com campos ao abandono, vivendas de estilos híbridos de qualidade duvidosa a ornamentarem os cabeços e flancos das serras ao deus dará?

    Não.

    Até mesmo com as antigas casas de pedras soterradas por silvas, dezenas de fábricas de lata reluzente a ferirem-nos a vista e a alma e eucaliptais invasivos que cobrem muitas vezes as maravilhas das lixeiras industriais?

    Não.

    De facto só uma terra abençoada pela natureza pode permanecer bela com todos esses crimes e atentados contra ela.

    Miguel Esteves Cardoso disse: "O Minho é uma menina ... Olhos Verdes impossíveis".

    Bem, esse Minho, que existe no Vale do Ave já não é uma Menina. Porém, os seus olhos verdes continuam lá como uma eterna lembrança saudadosa. Parece uma velhinha, gasta pelo tempo e pelos dados inevitáveis que esse comete no corpo. Mas mesmo as velhinhas mantém os seus belos olhos,

    Importa referir isso da paisagem quando se fala de musica folclórica.

    Importa tanto que até Alberto Pimentel na sua obra de referência "As Alegres canções do Norte", fala da influência da paisagem no carácter dos Minhotos.

    Ao mesmo tempo disse também: "Os Minhotos, quando nascem, já sabem cantar".

    Por o seu lado, Miguel Torga escreveu: "As poucas alegrias que tive na vida, devo-as á Paísagem".

    Muitos outros notáveis se deslumbraram com Minho antigo. Aquele que eu apenas imagino por pertencer ao domínio da mocidade dos nossos avós.

    Vasconcelos Leite que dedicou metade da sua obra ao Minho. Almeida Garett que nunca se privou de descrever as maravilhas verdejantes desta região. José Augusto Vieira que esgotou adjectivos da sua obra prima "O Minho Pitoresco". D. João de Castro o brilhante e modesto autor de "Jornadas no Minho". Miguel Torga, uma das maiores vozes e alma defensora do rural Nortenho. Camilo Castelo Branco e as suas Novelas do Minho.

    Todos eles ficaram adoravam essa maravilha da Natureza.

    Hoje, ainda consigo ressentir algo de parecido ao subir por exemplo á St.ª Marta das Cortiças na bicicleta ao romper do dia e observar o mar de nevoeiro que esconde a civilização como um manto de algodão do qual apenas conseguem romper, do Gerês ao Marão, entalados pelo bravo Atlântico, as fragas dos montes mais valentes.

    E esta paisagem e este encanto que faz cantar o Minhoto. E a beleza dos cantos é proporcional á terra de quem os profere.

    Consequentemente, o desencanto que o desenvolvimento trouxe, teve reflexo na modernidade dos ranchos folclóricos.

    Agrupamentos que considero de boa alma onde se encontra talento puro mas, infelizmente, devotos a um modo de exprimir e ensinar a sua cultura que não só é mentiroso, como de mau gosto.

    Hoje tem havido um certo renascimento do folclore. Do folclore positivo. Daquele que apresenta qualidade e genuinidade. De certo nunca ultrapassará o numero dos que preferem o modo aberrante do "rancho comum". Porém, a intenção está lá.

    Quase sempre por jovens educados (ou naturalmente inteligentes), partilho imensas conversas com gentes de opinião revolucionária sobre esses assuntos.

    Quem gosta de folclore, do verdadeiro, é pessoa sempre inteligente e sempre mais equilibrada do que os outros.

    Isso porque entender porque é que uma expressão musical pode definir um povo melhor do que qualquer tese de fim de curso, é sinal da perfeita integração do seu ser no mundo que o rodeia.

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  2. Muito obrigado pelo comentário, apreciei muito! Vejo que anda pelo BTT, conhece os meus irmãos de certeza!

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  3. É, isso do BTT tem esse lado de redescoberta, um pouco como voltar à infância e lembrar as idas monte acima ate ao Penedo da Cobertoira, as caminhadas até à Citânia, ao Sameiro.
    Não se trata apenas o prazer do desporto, do contacto com a natureza, esse mar verde que visto lá de cima da montanha é de uma beleza inigualável. Sabias que na Serra de Santa Luzia em Viana do Castelo, muito para lá do Santuário, em plena serra cheira a mar ?
    São autênticas viagens culturais, há tanta história por esses montes fora, em qualquer canto uma coisa nova.
    Fazer o Caminho Português de Santiago pelo interior, por exemplo, é algo de transcendente.

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  4. Eu ando de BTT sozinho. A verdade é que pelo caminho dou atenção a certas coisas que me fazem parar. Na maioria dos casos, os praticantes que conheço não partilham da mesma curiosidade por uma capela românica, uma alminha antiga cujo fresco gasto importa decifrar e outras coisas do género.

    Quanto á bicicleta na Santa Luzia, já andei bastante. Começava na cidade, passando pelo santuário até á aldeia de São Mamede, continuava pela serra saindo no flanco ocidental da mesma em Afife. Foram horas de aulas muito bem faltadas. Não me arrependo nada!

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