Casa das Artes de V.N.Famalicão: Amor e Fúria


Pois vamos então hoje falar da grande banhada musical do meu historial de concertos.

O Amor. Desde os meus tempos de Viana, nas k7 dos meus amigos mais melómanos aqui e ali aparecia um rasto da música desolada dos Red House Painters, quantas vezes misturada com a vizinhança da 4AD (Cocteau Twins e quejandos). Aparte esses farrapos soltos eu conhecia mal a obra da banda. Não tinha ainda reforçado a escuridão de algumas noites ao som de Ocean Beach, e o tempo de Old Ramon não tinha chegado. Mais tarde o meu irmão Paulo arranjou lá para casa o duplo Retrospective, ao qual demorei a aderir, pelas vocalizações áridas e pelas guitarras antimelódicas, não tão longe assim do estilo dos American Music Club, mas sem dúvida com mais reverberação e delay, marca registada da 4AD, como ouvimos nos This Mortal Coil. Novos artistas da editora como os Beirut (boa música via minoria ruidosa) já perderam o respeito ao pedal. Como acontece invariavelmente comigo demorei a gostar dos Red House Painters, mas a insistência compensou os franzires de testa iniciais.

A Fúria. No dia 25 de Maio de 2005 V.N. de Famalicão era o alvo. Mark Kozelek (o mentor dos Red House Painters) tocaria nessa noite, com uma tal de Lisa Cerbone que teve a sua noite de glória. Chegamos ao concerto, tudo normal. Entramos na sala...tudo normal. Entrou uma loira de guitarra em punho, muito insegura, ok - temos de a aguentar até ao Mark. A loira toca uma, toca duas, toca três...e parece espantada pelo estoicismo do público assistindo à sua actuação sem arredar pé. Agradece, nervosíssima, esquece-se dos acordes...e continua. Nunca vira tamanha primeira parte, mas lá me aguentava, incrédulo, mais o Paulo. Intervalo, saímos da sala e cá fora temos um comunicado, que resumidamente dizia: O Kozelek pirou-se. A moça da primeira parte pensara que nós sabíamos desde o início e que mesmo assim tínhamos decidido assistir a um concerto só dela sem reclamar o dinheiro dos bilhetes de volta.

A verdade foi que horas antes do concerto o Kozelek meteu-se num táxi, foi para o Porto e desapareceu do mapa astral. A parte oficiosa da história podem ler aqui. Estupefacto e furioso fiquei, e ainda não me esqueci do truque de só afixarem a comunicação a meio do concerto. Já não me lembro se voltamos à sala, ou se fomos logo embora, talvez o Paulo se lembre. Da Cerbone não ficou muita memória.

Foi assim a maior banhada em termos de concertos que tomei, seguida de perto pelo concerto do Morrisey no Coliseu do Porto.

Não deixo de pensar que a sala da Casa das Artes de V.N.Famalicão tem um je ne sais quoi de bizarro, porque entre artistas que desaparecem, outros que mandam o público levantar-se e visões de altas patentes da marinha a dançarem rancho fardadas, já não consigo escolher a melhor história. E foram só dois concertos. Estou ansioso por lá voltar.

Comentários

  1. Foi realmente um episódio de má memória essa cena com o Mark Kozelek. Entretanto Famalicão já me compensou com dois grandes concertos, um do Mark Eitzel sozinho à guitarra e outro do John Cale.
    Ainda não estou totalmente recomposto e ainda não fui devidamente ressarcido do episódio mais recente, em que o Malhão foi dançado por entre um mau concerto. Foi um choque, para mim que tenho boas memórias de ver um bom rancho a cada romaria. Ver o meu amigo Zequinha Gafanhoto dançar no Rancho de Sta. Cristina continua a ser o meu ideal de rancho. Um choque, foi o que foi.

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