Algo danificado
"O homem é superável. Que fizestesReznor, sob a capa de Nine Inch Nails, fez da auto-superação e do perfeccionismo o seu caminho, assim que deixou a programação de computadores pela programação de midis e samplers.
para o superar?"
Desde que desceu da montanha, acompanhado pela águia e pela serpente, Reznor procurou desde o primeiro passo rodear-se daqueles que o ajudariam na sua peregrinação. Logo em Pretty Hate Machine, totalmente desconhecido, contou com a colaboração de Adrian Sherwood(Depeche Mode), cujo trabalho abominou, substituindo-o por Flood(Jesus and Mary Chain e U2 - Achtung Baby). Logo no primeiro vídeo(Down in it 1989) a intenção e a iconografia estão lá.
Com Downward Spiral de 1994, os NiN são catapultados para o estrelato. O álbum revolve as entranhas do criador e atira-as cá para fora a disparos de sequenciador. Num dos grandes álbuns dos anos 90, Reznor vai escalando na montanha da auto-superação, para um estágio semi-divino, e em Closer berra mesmo 'You get me closer to God'. Com o seu toque de Midas cria um monstro, Marilyn Manson, produzindo Antichrist Superstar. Partilha uma digressão com David Bowie, que o trata como um delfim e permite aos NiN serem a sua banda de suporte, faz as bandas sonoras de Lost Highway de David Lynch, de Natural Born Killers de Oliver Stone, do jogo de computador Quake, e já acima do Homem comum perde o contacto com a sua própria condição humana.
Em 1997, Trent Reznor cumpre mais um compasso do calvário Zaratustriano:
Assim falou Zaratustra no píncaro daNuma reveladora entrevista a Tom Lanham, diz:
montanha onde reinava o frio, mas,
quando chegou perto do mar e se
encontrou sozinho entre as rochas da
margem, sentiu−se cansado do caminho
e ainda mais cheio que dantes de
ardentes desejos.
After I got everything I ever wanted, I was fucking worse off than I was before.A morte da avó que o criou agrava o estado depressivo, e Reznor ruma a Big Sur, na Califórnia, para se recompor e trabalhar. Desse período sobra 'La Mer', contido em The Fragile, talvez o mar fragmentado e indomável, reflexo do estado mental de Reznor na altura.
Mas Reznor não se esquece , embora tendo sido forçado a render-se à sua condição de humano - e não supra-humano, a regra da auto-superação. Durante dois anos cinge-se a uma dieta de trabalho rigorosa, com Alan Moulder como seu assistente, e cria sem destino nem objectivo. No fim possui uma massa informe de música diferente de tudo o que existia em termos musicais ao momento.
O perfeccionismo exige os melhores, e Reznor chama Bob Ezrin, produtor de Berlin, de Lou Reed e de The Wall dos Pink Floyd, e pede-lhe para extrair uma entidade coerente daquela massa musical. Após uma tentativa falhada, Ezrin emerge com o alinhamento de The Fragile, uma obra prima. Reznor chora compulsivamente, e a catarse acontece.
The Fragile, é uma obra humana, mas de uma humanidade revestida de talento à qual a maior parte de nós pode apenas aspirar. Alternado momentos reflexivos, instrumentais alguns, com a revolta e a raiva, deleitando-nos com uma experimentação sonora de delicada filigrana, é Reznor destilado em música.
De uma beleza extrema, The Fragile não é a celebração do Super-Homem Trent Reznor, mas sim a sua gesta, uma espécie de Odisseia sonora do outro lado da escalada, o da descida.
E depois? Reznor, o visionário, continua a ultrapassar-se, seja estendendo a realidade com Alternate Reality Games, seja maximizando o uso da sua presença na Web(o último movimento foi vender todos os instrumentos das digressões no eBay, para além de desancar Chris Cornell no Twitter), seja ainda lutando para que o fim da indústria discográfica como a conhecemos chegue depressa(The Slip pode ser descarregado gratuitamente).
A música continua excelente, pessoalmente estou centrado agora em The Slip e no quadrúplo Ghosts, uma aventura experimental e instrumental, que repete o arrojo de Bowie em Low e Heroes, ao enveredar pelas ambiências.
Eu tenho uma aversão natural por todo o tipo de idolatrias, mas este gajo anda-me a tentar.
E tudo mais que poderia ter sido
ResponderEliminara idolatria nem sempre é negativa...é a expressão daquilo que nos faz feliz,nos faz pensar,nos faz fluir...eu idolatro Amalia Rodrigues.Nunca me fez mal...pelo contrario.Ja me ajudou!
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